O Canal

O FalaLu, meu canal no YouTube, é um desafio novo e que tem garantido uma dedicação ímpar e muito aprendizado. Levar a ciência para o público de geral de forma simplificada, porém embasa e séria.

Espero sempre contar com vocês para fazer um conteúdo prático e colaborativo!

http://youtube.com/falaluhaddad

Nasce um site

Aos 13 anos comecei a escrever um diário. Naquelas páginas cor de rosa, descrevia diariamente meus desassossegos e descobertas da adolescência, sempre acompanhado de uma poesia. Os cadernos se multiplicaram, e certamente me ajudaram a lidar com as angústias da juventude.
Aos 16 anos entrei na Faculdade de Medicina, e por não ter idade para ganhar um carro, pedi um computador. Objeto ainda raro em lares estudantis, meu IBM Aptiva e conexão discada a internet (daquelas que ocupava a linha do telefone fixo de casa) foi minha primeira conexão com o mundo. Minhas escritas se digitalizaram.
Vivi MSN, ICQ, Orkut... Em 2006 criei meu primeiro blog, o "Voilá", onde compartilhei minhas aventuras morando na França.
Em 2008 a maternidade era o foco, e nasceu o "Ainda Assim Sem Nome". Foram 2 abortamentos espontâneos, o luto e mais angústias, até a gravidez da Nina. Compartilhei tudo até seu primeiro ano. E me ajudou a sobreviver sem terapia.
Em 2011 abri minha conta no Instagram. E aqui venho depositando minha descoberta do esporte, as transformações da vida, amores, filhos e tanto mais. Em meio a muito conteúdo de amenidades, algumas vezes abri meu coração e escrevi como fazia lá atrás, nos meus diários. Como se ninguém fosse ler, falei de dor, de desejos, de medo.
Agora nasceu o FalaLu - e além da vontade de compartilhar, resolvi começar um repositório de tudo isso. E estou há alguns dias quebrando a cabeça para fazer meu site. Sorte que antes de ficar louca com o worldpress, o @ me salvou. E seguimos construindo esse filho a 4 mãos.
Mas como toda mãe orgulhosa, não aguentei esperar os arremates, e já apresento ele aqui: o Falalu.com.br. Tem história no esporte, na medicina, comecei a colocar meus textos (faltam muitos, pois vou resgatar os lá do passado...) e vou compartilhar as participações em podcast, youtube, TV, etc.
Como mãe de primeira viagem, aceito humildemente sugestões e ajuda. Ainda assim, espero que gostem.

Sobrevivência Humana

Se no começo eu tivesse sabido dos passos que teria que dar para chegar até aqui, acharia o caminho longo e tortuoso.

Não sabendo, caminhei dia após dia.

Hoje olho para trás e a memória faz a travessura de embaralhar as lembranças para que pareçam menos atrozes.

E assim se dá a sobrevivência humana.

Não deixe o dia te atropelar

Não deixe o dia te atropelar...

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Se não houver um papo solto e sem pressa...

Se não houver uma refeição saboreada na paz...

Se não houver um suspiro de conclusão de qualquer coisa bem feita... pequenas metas com começo, meio e fim...

Se não houver um prazer físico...

Se não houver uma conexão humana, presencial, on-line, telefônica, por e-mail ou direct

Se não houver a expressão de um sentimento verdadeiro, de preferência uma risada gostosa, mas vale até um choro triste mas cheio de lágrimas.

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Se você passou um dia se quer sem nada disso, você deixou o dia te atropelar. E nossa vida é preciosa demais para desperdiçarmos um dia se quer.

Minha vida estóica

  1. Mude o que você pode — esqueça o resto
  2. Saiba quando seguir (e quando parar)
  3. Pare e agradeça
  4. Sempre ame
  5. Vá fundo dentro de si mesmo
  6. Seja gentil
  7. Torne-se bom agora
  8. Concentre-se no seu interior — não julgue os outros
  9. Aproveite o dia
  10. Você não pode ter tudo – aprenda a priorizar
  11. Desconstrua seu ego
  12. Receba elogios e críticas da mesma maneira
  13. Cultive empatia e altruísmo

Liberdade

Eu desejei a liberdade como alguém que estivesse de fato preso. Mas ainda por ter sido privada sem o cometimento de crime. E acrescido da tortura que é a dor e o desconforto. Assim, por dias e dias, só fiz olhar uma janela, e desejar estar fora. Sentir o sol, o vento, o pé no chão.

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Sai do confinamento e me vi de volta num mundo ainda mais atingido pela pandemia. Do meu primeiro dia em casa até agora uma escalada de mortes pela COVID, falta de leitos, e tanto sofrimento. Assim, a vida fora estava substituída pela privação coletiva da liberdade, certamente um dos poucos remédios para a doença que nos aflige. E nunca foi tão fácil para mim ficar em casa.

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Em casa tive o alento infinito da presença de meus filhos. Tive o sol na varanda e as plantas no terrário. Tive o conforto das coisas que só percebemos quando temos pouca escolha; como alimentos, horários, e um mínimo de autonomia e privacidade. Como faziam falta na internação! Estar em casa foi alegria, confirmando a máxima de que tudo é relativo.

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E só agora encontrei de fato aquela sensação que ansiava lá no hospital. Pé no chão, o mar ao longe e o vento. Mesmo sem poder pisar na praia ou por o pé na água, de novo, considerando a relatividade das coisas, me senti extremamente privilegiada e grata.

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Espero não perder esse prazer das pequenas coisas que está veemente em mim. Parece um presente que ganhei disso tudo, precioso e raro. Um presente que cabe a mim conservar. E se conseguir, distribuir àqueles que eu puder e que estiverem dispostos a ouvir e compreender.

Medida

Está difícil essa medida.

Do quanto, do certo, do tempo.

Não sei exatamente onde quero chegar. Onde posso. Só sei o que já fui. Fica difícil escolher a régua.

Já sei dos obstáculos: a dor, e agora a tontura, a náusea e todo essa mal estar.

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Do outro lado a minha força, a minha vontade quase infinita. Um desejo constante de independência, de não precisar do outro. Mas tenho aprendido que sem o outro, não vou longe não... Aliás, em dias como hoje, sem o outro sou só um corpo jogado no chão.

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Por mais que eu julgue estar fazendo somente o certo, obediente e disciplinada, tem muito incerteza nesse caminho. Erro e acerto caminhando lado a lado, custando não se cruzar.

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Aprendi um tanto, mas em dias como hoje me sinto analfabeta. Que eu aprenda a pedir ajuda, que eu aprenda que não posso tudo, que eu aprenda a aceitar e agradecer. Simples? Tanto quanto ter paciência, dar tempo ao tempo e não ter pressa. Simples?

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Está difícil acertar a dose. Do analgésico, do antiemético, do trabalho, do exercício, da independência, do otimismo, da esperança. Me entreguem a balança e seu manual. Porque está difícil. Mas eu vou gastar a energia que resta para fazer essa medida. Eu só não desisto de mim. Não hoje. Não nunca.

Se permita

Se permita...

Sentir tristeza. As vezes é só isso... o peito apertado, olhos mareados, uma respiração profunda. Se permita chorar. Não é fraqueza, não significa que você desistiu... Deixe as lágrimas correrem à vontade. Até que você resolva enxugá-las no espelho, onde busca diariamente se encontrar. Um corpo que nem sempre reconheço, de alguém em transformação diária. Essa dor da reconstrução que me acompanha e não permite esquecer. E nem quero! Então sofro, para seguir em frente enquanto cicatrizam minhas feridas...

Se permita...

Sentir saudades. Do mundo lá fora, do sol, do vento na cara, do abraço apertado, da corrida leve, do coração na boca, da natureza, do primeiro mergulho na piscina vazia... Da madrugada, da rotina, das caramanholas, dos amigos... Dos desafios do trabalho, das pessoas, do dia que corre ligeiro, do papo do almoço, do prazer de comer, da fome... Das crianças e suas brigas, seus interesses, seus abraços, suas risadas...

Se permita...

Sentir cansaço. Sentir desanimo. Sentir dor. Sentir vontade do que não posso ter (porque detesto a palavra inveja...). SENTIR.

Havendo sentimento e transformação, haverão momentos de alegria, de felicidade, de prazer e paz. E é o tempo que os fará mais frequentes. O tempo e eu!

Susto

Sexta-feira de sol.

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Me acordam no susto às 5:30, medicação, ai, ai...

Cochilo, e às 6 de novo, toma lá seu comprimido... Não vou sair mesmo daqui, meu compromisso é só as 8... cochilo.

As 7 entra a copeira: café! Não me movo, apetite zero.

Cochilo, porque meu despertador esta para 7:35

As 7 pá, a porta: sinais vitais! Minha frequência cardíaca podia até subir de raiva, mas segue calma como meu semblante, de quem aprendeu a aceitar e ser gentil, sempre.

Agora deu. Coloco o óculos e o mundo acorda para mim com nitidez. Sentar ainda é um ato consciente e doloroso. Ficar em pé é melhor. E é sempre no banheiro, ao lavar meu rosto, que me dou conta da lesão na minha mão esquerda. O rosto sente a mão que não sente o rosto. Meu cérebro acha graça. Eu não!

Abrir a caixinha da lente faço com a esquerda: penso em contar para a terapeuta ocupacional, que vai se orgulhar de mim. Todos os atos cotidianos estão sendo construídos nessa nova condição: escovar os dentes, a lente, o xixi, o cabelo, o banho. E noto minha expertise progredindo bem.

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O sol bate forte na janela do quarto. 7:55 e visto o privativo verde, meu short e tênis verde. Aguardo ansiosa a fisioterapeuta. Cada atividade ganha uma importância única quando a vida esta resumida à uma quarto e à solidão. Passar 45 minutos com alguém dedicado à minha melhora me faz tentar executar cada ação com perfeição. Quero aproveitar cada segundo. Sentir a musculatura trabalhando, algumas abandonadas nos últimos 22 dias. Olho meu corpo no espelho e estranho a magreza de minhas pernas.

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Tem chão Luciana, tem muito chão pela frente... Ainda são 9 horas e só hoje temos mais 15. O tempo aqui passa em horas, minutos. Imagina quando eu começar a contar os dias, semanas? Então calma lá que ninguém está com pressa, e ninguém tem certeza de onde posso chegar. Onde eu quero? É isso que estou descobrindo na próxima atividade, com a psicóloga. Segue a sexta!

21 dias

Hoje faz 3 semanas do acidente. 21 dias. Para mim parece muito mais... Está tão longe o tempo em que meu corpo era pura energia, minha vida um transitar constante de atividades intensas e a minha mente sempre ligada no 220W vivendo o hoje mas já construindo o amanhã.

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Agora é só um dia de cada vez. Dias longos. Tão diferentes que parecem gritar: o progresso nunca é uma linha reta! Ah, sim!!! Porque são muitos altos e baixos que preenchem as 24hs dentro desse hospital. Sem dor, pouca dor, ai que dor! Fome? Pouca. A comida me olha cada dia com mais estranhamento, como se a nossa amizade tivesse perdido a graça. Aliás, pouca coisa tem graça por aqui.

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Eu tento criar rotina nesses 20m2, mas nem a rotina me pertence. A enfermagem entra e sai, a rotina é deles: sinais vitais, medicamentos, exame. Fez cocô, xixi, comeu? Fisio, TO, psico. A hora deles. E eu transito entre o nada e esses breves momentos de contato humano, que aos poucos se tornam apego.

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Porque de resto tem a solidão, que não vivi no primeiro hospital e a infinidade de médicos, amigos, visitas e ocorrências. Eu não sou aversa a solitude, e sempre lidei bem com ela. Mas em momentos de fragilidade a ternura faz falta. Sorte a minha viver em tempos que a tecnologia aproxima, através de vídeo, mensagem, redes socias. Longe, mas não desconectada ou desprovida de suporte. Amém!

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O apreço maior é pela ideia de evolução. Sim, já entendi que terei altos e baixos, mas quero saber que estou seguindo em frente. E é por isso que cá estou: pelo esforço coletivo de pessoas excepcionais em me colocar numa situação muito melhor do que a que eu entrei. Para que eu saia mais apta física e mentalmente para enfrentar minha realidade de vida, trabalho e esporte lá fora.